30 maio 2009

A Igreja Matriz do Divino Espírito Santo

Adilson Santos - artista plástico poçõense


Este era o nome pomposo que tinha a igrejinha de Poções, até ser construída uma maior. Porém, sei que nunca vou chegar a uma conclusão se a igrejinha antiga era grande ou pequena. Vista de fora, parece pequena, mas vista de dentro parece grande, principalmente quando dava a impressão de abrigar Poções em peso, durante a Festa do Divino.
Tinha gente no coro, na sacristia, nos degraus do altar, na escada encaracolada, todos apinhados ordeiramente.
Na porta principal ficavam os homens. Podiam entrar e sair da igrejinha. Cumpriam a obrigação, mas não com tanto ardor. Na porta da sacristia ficavam os homens congregados marianos,comandados por Diolino Luz e Corinto Sarno, de fita azul no pescoço. Mais perto do padre. Mais perto de Deus, acreditavam eles.
As velhas beatas, vindas dos bairros pobres, ficavam nos bancos da frente, com seus rostos engelhados, as mãos calosas segurando o terço e o olhar baço, perdido. As roupas eram simples, desbotadas, mas davam a impressão que eram suficientes para enfrentar o frio da noite.
A qualquer hora que chegassem as fiéis ricas tinham as cadeiras reservadas. Eram de tampo móvel e serviam para sentar e ajoelhar. As cores dos estofados não eram discretas, como também não o eram os grandes nomes das proprietárias, gravadas na cadeira: Annina, Railda, Francisca...e eu podia reconhecer neles todas as minhas tias. Assim, no meio de todo aperto, tinha sempre uma cadeira livre esperando a dona. Pelos véus, da seda ao algodão, classificavam-se socialmente os fiéis.
No ar, o cheiro de incenso, vela queimando e aquele suor perfumado. Tudo ali parecia ter cheiro , até o sermão do padre.
A cerimonia era uma monotonia em latim, mas todos estavam ali inarredáveis. E cantavam em uma altura tal que, ou suponham Deus surdo ou pretendiam demonstrar o tamanho da fé pela estridência do canto. O som do harmônio, tocado por Bil, e a voz de Lurdinha Amaral davam um tom sacro a tudo aquilo.
E o padre Honorato falava. Contra os protestantes, contra Carmem Miranda, contra o decote, contra o comunismo, contava e recontava as parábolas, citava em latim, cuspindo erudição sobre um pobre povo cuja culpa era ter fé.
As imagens dos santos, nos seus pedestais pareciam tudo sentir e ouvir. Elas olhavam complacentes para aquele povo piedoso, ora apontando para corações expostos, ora apontando para chagas expostas.
Eu ficava sentado embaixo do altar lateral, perto das minhas tias, longe da sacristia e ainda sem o direito de ficar na porta principal, impressionado com tudo aquilo, achando tolamente que ali estava o caminho, a verdade e a vida.

Eduardo Sarno

17.março.01

3 comentários:

  1. Será que você não está enganado? Acho que o pintor Adilson Santos é conquistense.

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  2. Eduardo Sarno31.5.09

    A certeza é absoluta: Adilson Santos nasceu em Poções e atualmente reside em Vitória da Conquista-BA

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  3. Patricia6.11.11

    Adilson nasceu em Poções sim.

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