A MACARRONADA
* crônicas poçõenses *
Minha mãe, ao voltar da missa dominical, dedicava-se à
tarefa da preparação da macarronada, com a ajuda de Joaninha, nossa empregada
de muitos anos.
A farinha de trigo era de boa qualidade, mas nem
sempre foi assim. Na década de 30, a farinha demorava tanto a vir de Salvador
para Poções, que invariavelmente chegava estragada.
A massa, preparada com ovos do quintal, era
primeiramente aberta na máquina manual, marca “Rapid”, vinda da Itália, mas
provavelmente de fabricação inglesa, e que uso até hoje. As tiras eram
espalhadas sobre a mesa de pedra da
cozinha, e depois passada no cilindro do “spaghetti”. O outro cilindro era para o “talharim”.
A grande panela de alumínio já estava sobre o fogão a
lenha, aquecendo a água.
O “sugo” era feito de tomates previamente cozidos, aos
quais se juntava as “polpetas” (do latim “pulpa”) ou então bifes de carne macia, enrolados e
espetados em um palito.
O uso de tomates e verduras por parte dos italianos em
Poções, Jequié e Jaguaquara criou uma demanda, que foi suprida tanto pelos próprios italianos que se
dedicaram à agricultura, como pelos agricultores locais.
A travessa,
antiga e enorme, de porcelana, já
aguardava sobre a mesa da copa ou, eventualmente, da sala. A fome rondava a
casa, e os comensais não se afastavam, prontos para “mangiare”.
Meu pai não se sentava à cabeceira da mesa. Tinha o
costume e a preferência de sentar-se ao lado da cabeceira, por ser um lugar
mais resguardado e ter a visão da copa e do quintal, com a parreira e o pé de
laranja lima. Quando havia convidados, que lhe reservavam a cabeceira da mesa
ocorria sempre a necessidade desta explicação.
O primeiro prato a ser servido era o do meu pai, e em
seguida dos filhos. Minha mãe revelava prazer imenso nesta tarefa de alimentar
a ninhada.
Meus pais, e eventualmente nós, usávamos a colher para
auxiliar o garfo a enrolar o 'spaghetti'. Era um antigo costume italiano.
O horário da refeição era sagrado, ninguém podia se
atrasar. Nem mesmo meu pai. Quando isso raramente ocorria, era repreendido por
minha mãe. Ele respondia de maneira jocosa
e sorrindo: “- Dona Nina, Dona Nina...!!”
Normalmente o consumo eram dois pratos “per capita".
Nas ocasiões festivas bebia-se vinho tinto frisante.
A tarde era
dedicada à digestão. Eu sentava sózinho na varanda e ficava observando a rua,
na tarde dominical, semi-deserta. Quando passava um transeunte, eu me
perguntava mentalmente, com um leve sentimento de culpa, se ele estaria tão bem alimentado como eu.
Eduardo Sarno
2019
Nenhum comentário:
Postar um comentário